Temos ainda uma arma de luz...


"Há quem julgue que nos venceu
só porque estamos para aqui, famintos e nus,
de novo sem terra nem céu,
a apanhar do chão
às escondidas do luar
os frutos podres caídos dos ramos.

Mas não.

Temos ainda uma arma de luz
para lutar:
SONHAMOS.

...enquanto os outros, os traidores,
sem lutas nem cicatrizes
entregam a terra ao rasto dos gamos
e douram os olhos dos velhos senhores
com voos de perdizes...

Sim, sonhamos.
E o sonho quem o derrota?
- mesmo quando vamos
perdidos na rota
de um barco sem remos
na tempestade de um vulcão.

Sim, camaradas, sonhamos.

SONHEMOS!

O sonho é também acção."


"Termidor Errado (25 de Novembro de 1975/XVIII [O Sonho é a nossa arma]", poema de José Gomes Ferreira, Porto, 1900-1985

2 comentários:

M.A. disse...

Deixo aqui um poema que encontrei eata noite no meu jardim.

espero que gostes dele.é uma arma de luz...

"No jardim da minha mãe
o meu ancinho junta as estrelas
que caíram enquanto eu cá não estive.
A noite está quente e os meus membros
exalam a proveniência verde,
flores e folhas,
o grito do melro e o bater do tear.
No jardim da minha mãe
piso, descalço, as cabeças das cobras
que avançam, a espreitar, pelo portão ferrugento
com línguas de fogo.



Tradução
José A. Palma Caetano
(in «Na terra e no Inferno»,
Assírio & Alvim, 2000)

Thomas Bernhard
(Áustria, 1931-1989)


***maat

lupuscanissignatus disse...

E um alfobre, também.

Sementes de luz que trespassam a memória...

Obrigado. Fim de semana luminoso, Maat.