Avalanche em pleno estio, Celeste absorvia com sofreguidão as nuvens que vogavam céleres nas fundas correntes dos seus pensamentos. Absorta pelo seu precário e mutável destino, do intrincado novelo que toldava o movimento das mãos, tudo o que retinha eram águas que, supunha, já não moviam moinhos - atalhos de terra batida, veredas de branquíssimos amieiros, lareiras aquecidas pela ternura e pedras sagradas, brilhantes como diamantes. Dir-se-ia que tudo se esfumara na poalha dos caminhos e que a encruzilhada com que agora se defrontava esmorecera o fogo da procura [a sua demanda]. Nada mais errado... Lembrava-se, com gozo pueril, do perfume da flor da laranjeira que seu avô plantara no pequeno quintal de casa, do gigantesco tamanho dos cardos que se abeiravam da janela do comboio [e que ela fazia questão de tocar], do sabor adocicado dos grãos da romã a desfazerem-se no céu da boca. Celeste riu-se dela própria e do tumultuoso rio de dúvidas que a submergira. Agora percebia o valor dos símbolos e a sua intrínseca perenidade. Mós que alavancam o Ser a uma dimensão que estilhaça todas as correias e ampulhetas. Sim, eram esses os frutos que nutriam o sangue com as células da perseverança e da resistência. De uma golfada, encheu de ar frio os pulmões, susteve a respiração por segundos, e, fitando o trilho por onde subira, fincou os pés na cristalizada rocha do futuro...