Ca(n)tando as uvas...


"Errante, fui cantando
entre as uvas
da Europa
e sob o vento,
sob o vento da Ásia.
O melhor das vidas
e da vida,
a doçura terrestre,
a paz pura,
fui recolhendo, errante,
recolhendo.

Com meu canto
ergui na boca
o melhor duma terra
e de outra terra;
a liberdade do vento,
a paz entre as uvas.

Pareciam os homens
inimigos,
mas a mesma noite
os cobria
e só uma claridade
os despertava:
a claridade do mundo.

Entrei nas casas quando
comiam à mesa,
vinham das fábricas,
riam ou choravam.

Eram todos iguais.

Todos tinham olhos
para a luz, procuravam
os caminhos.

Todos tinham boca,
entoavam cantos
à primavera.

Todos.

Por isso
procurei entre as uvas
e o vento
o melhor dos homens.
Agora tendes que ouvir-me."



"Prólogo - Tendes que ouvir-me", poema de Pablo Neruda, in "As Uvas e o Vento", tradução de Albano Martins, Edição Campo das Letras, 2007
"I love that grape", fotografia de Alexey A. Guzeev, in http://www.photoforum.ru/

4 comentários:

M.A. disse...

é espantoso este Neruda!
Não me canso de o ler...

Obrigada,
Amigo,

***maat

Dalaila disse...

gosto sempre tanto de Neruda, leio e releio, e sinto-o sempre de forma diferente obrigada

lupuscanissignatus disse...

Olá Maat!

Neruda desnuda o real com uma sabedoria irreal...

Abraçinho.

lupuscanissignatus disse...

Olá Dalaila!

Também não me canso de o ler.

Mas prefiro os poemas de amor aos políticos.

No amor, sinto-o mais leve e seguro...

Pudera...:)


Abraçinho.