Mariza: a voz que caminha liberta...

O mundo que criemos nos cumpre tê-lo como coisa que não é nossa...



"Não sei, meus filhos, que mundo será o vosso.
É possível, porque tudo é possível, que ele seja
aquele que eu desejo para vós. Um simples mundo,
onde tudo tenha apenas a dificuldade que advém
de nada haver que não seja simples e natural.
Um mundo em que tudo seja permitido,
conforme o vosso gosto, o vosso anseio, o vosso prazer,
o vosso respeito pelos outros, o respeito dos outros por vós.

E é possível que não seja isto, nem seja sequer isto
o que vos interesse para viver. Tudo é possível,
ainda quando lutemos, como devemos lutar,
por quanto nos pareça a liberdade e a justiça,
ou mais que qualquer delas uma fiel
dedicação à honra de estar vivo.
Um dia sabereis que mais que a humanidade
não tem conta o número dos que pensaram assim,
amaram o seu semelhante no que ele tinha de único,
de insólito, de livre, de diferente,
e foram sacrificados, torturados, espancados,
e entregues hipocritamente à secular justiça,
para que os liquidasse com suma piedade e sem efusão de sangue.
Por serem fiéis a um deus, a um pensamento,
a uma pátria, uma esperança, ou muito apenas
à fome irrespondível que lhes róia as entranhas,
foram estripados, esfolados, queimados, gaseados,
e os seus corpos amontoados tão anonimamenete quanto haviam vivido,
ou suas conzas dispersas para que delas não restasse memória.
Às vezes, por serem de uma raça, outras
por serem de uma classe, expiaram todos
os erros que não tinham cometido ou não tinham consciência
de haver cometido. Mas também aconteceu
e acontece que não foram mortos.
Houve sempre infinitas maneiras de prevalecer,
aniquilando mansamente, delicadamente,
por ínvios caminhos quais se diz que são ínvios os de Deus.
Estes fuzilamentos, este heroísmo, este horro,
foi uma coisa, entre mil, acontecida em espanha
há mais de um século e que por violenta e injusta
ofendeu o coração de um pintor chamado Goya,
que tinha um coração muito grande, cheio de fúria
e de amor. Mas isto nada é, meus filhos.
Apenas um episódio, um episódio breve,
nesta cadeia de que sois um elo (ou não sereis)
de ferro e de suor e sangue e algum sémen
a caminho do mundo que vos sonho.
Acreditai que nenhum mundo, que nada nem ninguém
vale mais que uma vida ou a alegria de tê-la.
É isto que mais importa - essa alegria.
Acreditai que a dignidade em que hão-de falar-vos tanto
não é senão essa alegria que vem
de estar-se vivo e sabendo que nenhuma vez
alguém está menos vivo ou sofre ou morre
para que um só de vós resista um pouco mais
à morte que é de todos e virá.
Que tudo isto sabereis serenamente,
sem culpas a ninguém, sem terror, sem ambição,
e sobretudo sem desapego ou indiferença,
ardentemente espero. Tanto sangue,
tanta dor, tanta angústia, um dia
- mesmo que o tédio de um mundo feliz vos persiga -
não hão-de ser em vão. Confesso que
muitas vezes, pensando no horror de tantos séculos
de opressão e crueldade, hesito por momentos
e uma amargura me submerge inconsolável.
Serão ou não em vão? Mas, mesmo que o não sejam,
quem ressuscita esses milhões, quem restitui
não só a vida, mas tudo o que lhes foi tirado?
Nenhum Juízo Final, meus filhos, pode dar-lhes
aquele instante que não viveram, aquele objecto
que não fruíram, aquele gesto
de amor, que fariam 'amanhã'.
E, por isso, o mesmo mundo que criemos
nos cumpre tê-lo com cuidado, como coisa
que não é só nossa, que nos é cedida
para a guardarmos respeitosamente
em memória do sangue que nos corre nas veias,
da nossa carne que foi outra, do amor que
outros não amaram porque lho roubaram."


"Carta a meus filhos sobre os fuzilamentos de Goya", poema de Jorge de Sena, in "Metamorfoses"


http://www.instituto-camoes.pt/cvc/figuras/jdesena.html

http://www.arqnet.pt/portal/biografias/goya.html

http://www.arqnet.pt/portal/imagemsemanal/maio01.html

Hipótese de futuro

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"O nosso amor está na proporção da liberdade que concedemos aos outros."

António Alçada Baptista, ensaísta

O rasto do desejo...



"Sou o único homem a bordo do meu barco.
Os outros são monstros que não falam,
Tigres e ursos que amarrei aos remos,
E o meu desprezo reina sobre o mar.

Gosto de uivar no vento com os mastros,
E de me abrir com a brisa nas velas,
E há momentos que são quase esquecimento
Numa doçura imensa de regresso.

A minha pátria é onde o vento passa,
A minha amada é onde os roseirais dão flor,
O meu desejo é o rastro que ficou das aves,
E nunca acordo deste sonho e nunca durmo."


"Pirata", poema de Sophia de de Mello Breyner Andressen

Só o amor concede eternidades...

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"As estrelas são os olhos de quem morreu de amor. Ficam nos contemplando de cima, a mostrar que só o amor concede eternidades."

Mia Couto, in "Estórias Abensonhadas"

Na tua vida vejo tudo o que vive...



"(...) No teu abraço, eu abraço o que existe,
a areia, o tempo, a árvore da chuva,

e tudo vive para que eu viva:
sem ir tão longe posso ver tudo:
na tua vida vejo tudo o que vive."


Excerto de "Soneto VIII", de Pablo Neruda, in "Cem Sonetos de Amor"

Descobri em mim um rio...



"A água e o tempo são irmãos gémeos, nascidos do mesmo ventre. E eu acabava de descobrir em mim um rio que nunca haveria de morrer."


Mia Couto, in "Estórias Abensonhadas"

As Mós e os nós II



(A meus avós)


Ouve-se já
ao longe
a desconcertante
ladaínha
dos chocalhos
ecoando
ancestrais
refrões
pelo dorso
do vale

Por detrás
dos montes
ruminando
ladeiras
de íngremes
contornos
cabras e ovelhas
seguem o pastor
na sua demanda
de aconchego

Da varanda
prescruto
com o olhar
os últimos raios
do poente
esmagarem-se
contra
as lajes
de xisto

Nas hortas
formigas
humanas
afadigam-se
em derramar
o precioso
líquido
por sementeiras
que hão-de
germinar
futuros

(Um perfume a terra
sedenta evola-se no ar e funde-se
com o cheiro da flor da laranjeira!)

Tímida
a noite
cai
sobre o
minúsculo
povoado
construindo
novas
métaforas
e lendas
a uma aldeia
enamorada
por adamastores
vestidos
de urze
e de tojo

Na fonte
perfilam-se já -
quais imberbes
mancebos! -
os cântaros
com a sua farda
azul uniformizada

Içados à cabeça
como mastros
de um navio
cada um tem
o seu porto
e o seu ritmo
a sua amurada
e a sua melodia

No terreiro
geografia
de todos
os reencontros
e despedidas
chão fremente
de risos
e de lágrimas
alfobre
de alegrias
e tristezas
os homens
dão largas
à conversa

Por todo
o povoado
se rumoreja -
nas toscas
e desalinhadas
pedras da calçada
nos alpendres
das casas -
até o próprio luar
enrubesce
quando escuta
certos magistérios!

Rendilha-se
o diálogo
com a ventura
de quem desfolha
um álbum de
fotografias
amarelecidas
pelo sol impiedoso

Nas Mós
aldeia de nós
laços afectos
e múltiplos dialectos
a argila que molda
as rugas do tempo
é a mesma com que
se edifica a morada
da candura

Ainda hoje
sinto o afago
dessas raízes
profundas
e indecifráveis
com que o majestoso
e omnipresente olmo
me prendeu à terra


É quando
o vento norte
me sussurra
enledos na copa
dos cabelos
que ouço a voz
de meus avós
crepitar
ao meu ouvido
- é nesse preciso instante
que tudo faz sentido!


V. Solteiro, 26.06.07
Imagem retirada de: http://mosdodouro.com.sapo.pt/

As Mós e os nós I



Inefável
andarilha
de noites
sonâmbulas
de esperança
e de trilhos
sinuosos
povoados
por giestas
e carrascos
a memória
do tempo
em que o canto
das cigarras
era um hino
ao ouro do trigo
veio pousar
qual cotovia
exausta
nas pupilas
incendiadas
pela ternura

V. Solteiro, 26.06.07

Imagem retirada daqui: http://www.cm-fozcoa.pt/

Se dá que pensar...porque não dá para agir?



"Para cada pessoa viver, é necessário uma pegada ecológica média geral (2,8 hectares). Mas Europa, EUA, Japão, Índia e China vivem muito acima daquilo que lhes é permitido por seus recursos ecológicos, com uma pegada que chega aos 600%. O Planeta suportará? (...)."

Leonardo Boff, teólogo e escritor, in Agência Carta Maior

http://www.ecodebate.com.br/Principal_vis.asp?cod=5604&cat=

As raízes do inconformismo...

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"Dão-nos um lírio e um canivete
E uma alma para ir à escola
E um letreiro que promete
Raízes, hastes e corola.

Dão-nos um mapa imaginário
Que tem a forma duma cidade
Mais um relógio e um calendário
Onde não vem a nossa idade.

Dão-nos a honra de manequim
Para dar corda à nossa ausência.
Dão-nos o prémio de ser assim
Sem pecado nem inocência.

Dão-nos um barco e um chapéu
Para tirarmos o retrato.
Dão-nos bilhetes para o céu
Levado à cena num teatro.

Penteiam-se os crâneos ermos
com as cabeleiras dos avós.
Para jamais nos parecermos
Connosco quando estamos sós.

Dão-nos um bolo que é a história
Da nossa história sem enredo
E não nos soa na memória
Outra palavra para o medo.

Temos fantasmas tão educados
Que adormecemos no seu ombro.
Somos vazios, despovoados
De personagens do assombro.

Dão-nos a capa do evangelho
E um pacote de tabaco.
Dão-nos um pente e um espelho
para pentearmos um macaco.

Dão-nos um cravo preso à cabeça
e uma cabeça presa à cintura
Para que o corpo não pareça
A forma da alma que o procura.

Dão-nos um esquive feito de ferro
Com embutidos de diamante
Para organizar já o enterro
Do nosso corpo mais adiante.

Dão-nos um nome e um jornal
Um avião e um violino.
Mas não nos dão o animal
Que espeta os cornos no destino.

Dão-nos marujos de papelão
Com carimbo no passaporte
Por isso a nossa dimensão
Não é a vida. Nem é a morte."


"Queixa das almas jovens censuradas", poema de Natália Correia, in "Poesia Completa"

Reinventar a solidariedade



"A arrogância e o ódio estão a passar de moda. Só a solidariedade, como expressão de cultura, pode salvar-nos."

Natália Correia, mulher de todas as artes & letras e cidadanias

http://www.leme.pt/biografias/portugal/letras/nataliacorreia.html

Entre nós...



"Ando por aqui perdido sem saber qual é o caminho que dá para o dia de amanhã. Eu não desisto de tentar compreender os porquês de tudo. Sinto é que ficou entre nós uma grande conversa suspensa, um lugar onde estou a temer entrar com medo de te magoar."

António Alçada Baptista, ensaísta

Cálidos frutos


De um trago
bebo a volúpia
que se apresenta
instável e derradeira
no magma incandescente
do teu revolto corpo

É um vulcão
de possibilidades
aquele que ofereces
com as mãos
repletas de romãs


Na ânsia de tocar o longe
que ficou colado á pele
abraço com força
o celeste tronco
de onde brotaram
tão cálidos frutos


Assim unidos
somos seiva
da mesma carne
somos mel
da mesma flor
de rosmaninho

V. Solteiro, 19.04.06

Esta ave não morre!



"Era noite fechada
na cidade insone,
saí para as ruas,
não sei que buscava:
Achei uma ave!
Achei uma ave!

A noite era dia,
a noite era dia,
para quem tinha
achado uma ave.
Ofegante corria,
deslumbrado corria,
a todos mostrava
a todos mostrava
a admirável ave
que na mão levava.

Mostrava-a feliz
aos vagabundos
e às prostitutas,
às criancinhas
e aos desgraçados,
e todos corriam
a meu lado vinham,
e todos levávamos
a ave sonhada:
Olhai esta ave!
Olhai esta ave!

Vinham os jovens
e as moças em flor
a ave pousava-lhes
no bico dos seios;
vinham os poetas
e os operários,
vinham os soldados,
vinham os sábios
e as costureiras:
Esta ave é nossa!
Esta ave é nossa!

A noite era dia
e, cheias as ruas,
éramos um rio
de risos, de lágrimas
de ansiedade;
levávamos o sonho
há muito sonhado,
levávamos a ave:
Onde outra igual?
Onde outra igual?

Foi quando vieram
os que não querem
nem flores nem ave
assim admiráveis;
de armas nas mãos
traziam o fogo
dos vivos infernos:
Largai essa ave!
Largai essa ave!

Então corri para eles
com a ave na mão,
olhei-os nos olhos
com a ave na mão
e a ave cantava,
sem corpo nos galhos
do meu ser violado;
a ave voava
sobre a cidade:
Esta ave não morre!
esta ave não morre!"

"A Ave sobre a Cidade", poema de Papiano Carlos, in "As Florestas e os Ventos"

Mundo opaco



"Que absurdo mundo este, onde o homem é só ausência do homem. Absurdo. espesso. Opaco."

Amos Oz, escritor israelita

A Terra é grande...é pequenina...

Gritar contra os muros que há na Terra...

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"São meus filhos. Gerei-os no meu ventre.
Via-os chegar, às tardes, comovidos,
nupciais e trementes
do enlace da Vida com os sentidos.

Estiveram no meu colo, sonolentos.
Contei-lhes muitas lendas e poemas.
Às vezes, perguntavam por algemas.
Respondia-lhes: mar, astros e ventos.

Alguns, os mais ousados, os mais loucos,
desejavam a luta, o caos, a guerra.
Outros sonhavam e acordavam roucos
de gritar contra os muros que há na Terra.

São meus filhos. Gerei-os no meu ventre.
Nove meses de esperança, lua a lua.

Grandes barcos os levam, lentamente..."

"Guerra", poema de Natércia Freite, in "Liberta em Pedra"

Sonho em risco...


A Organização Não-Governamental Médicos Sem Fronteiras apresenta uma exposição virtual de imagens (acompanhada de textos) que denunciam a situação de constante e extrema violência que se vive na Colômbia e cujas principais vítimas são, como sempre, os mais indefesos: mulheres, velhos e crianças.
"Sonho em risco:apanhados no círculo de violência em Colômbia", assim se denomina este grito de alerta. Para quem queira ouvi-lo...


http://www.msf.es/sites/colombia07/index.html

Lágrima de Preta



"Encontrei uma preta
que estava a chorar,
pedi-lhe uma lágrima
para a analisar.

Recolhi a lágrima
com todo o cuidado
num tubo de ensaio
bem esterilizado.

Olhei-a de um lado,
do outro e de frente:
tinha um ar de gota
muito transparente.

Mandei vir os ácidos,
as bases e os sais,
as drogas usadas
em casos que tais

Ensaiei a frio,
experimentei ao lume,
de todas as vezes
deu-me o que é costume:

nem sinais de negro
nem vestígios de ódios
Água (quase tudo)
e cloreto de sódio."

"Lágrima de Preta", poema de António Gedeão, in "Máquina de Fogo"

Se dá que pensar...porque não dá para agir?

O Homem só é mortal quando não ama...

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"O homem constrói casas porque está vivo, mas escreve livros porque sabe que é mortal. Vive em sociedade porque é gregário, mas lê porque se sente só. A leitura constitui para ele uma companhia que não ocupa o lugar de nenhuma outra, mas que nenhuma outra poderia substituir. Os direitos do leitor são: 1. O direito de não ler; 2. O direito de saltar páginas; 3. O direito de não acabar um livro; 4. O direito de reler; 5. O direito de ler não importa o quê; 6. O direito de amar os heróis dos romances; 7. O direito de ler não importa onde; 8. O direito de saltar de livro em livro; 9. O direito de ler em voz alta; 10. O direito de não falar do que se leu."

Daniel Pennac, escritor

http://fr.wikipedia.org/wiki/Daniel_Pennac

O deserto do mundo...

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"Para atravessar contigo o deserto do mundo
Para enfrentarmos juntos o terror da morte
Para ver a verdade para perder o medo
Ao lado dos teus passos caminhei

Por ti deixei meu reino meu segredo
Minha rápida noite meu silêncio
Minha pérola redonda e seu oriente
Meu espelho minha vida minha imagem
E abandonei os jardins do paraíso

Cá fora à luz sem véu do dia duro
Sem os espelhos vi que estava nua
E ao descampado se chamava tempo

Por isso com teus gestos me vestiste
E aprendi a viver em pleno vento."


"Para atravessar contigo o deserto do mundo", poema de Sophia de Mello Breyner Andresen, in "Livro Sexto"

A alternativa à paz é a morte



"Que alternativas temos nós, a não ser procurar a paz? Seja fácil ou difícil, é o nosso destino. A alternativa à paz é a morte. E uma paz má é melhor do que uma guerra maravilhosa."

Amos Oz, escritor israelita

A exclusão nas sociedades contemporâneas



"A Problemática da Exclusão nas Sociedades Contemporâneas." Este é o mote para a quinta edição da Revista Espanhola do Terceiro Sector, edição da Fundação Luís Vives.

http://www.fundacionluisvives.org/rets/5/index.html

Se dá que pensar...porque não dá para agir?

http://www.xtec.net/~aguiu1/calaix/040txetxenia.htm

"Quando veio a Moscovo na semana passada, o primeiro-ministro José Sócrates disse ao presidente russo, Vladimir Putin, que a União Europeia não iria continuar a pregar moral à Rússia a respeito dos direitos humanos, proclamando: 'Ninguém pretenda dar lições a ninguém'. Esta declaração constitui uma vitória para as políticas crescentemente autoritárias de Putin, um terrível golpe para a cercada sociedade civil russa e um mau presságio para a próxima presidência portuguesa da União Europeia. (...) Sócrates disse, justamente, que 'as democracias são sempre obras inacabadas'. Mas as suas palavras, de forma perturbadora, ecoam a recente declaração de Putin de que 'nenhuma democracia é perfeita'".

Allison Gill, Directora do Gabinete da Human Rights Watch, in jornal "Público", 09.06.07

"Sócrates traiu os direitos humanos na Rússia - Um mau presságio para a próxima presidência da União Europeia"

http://hrw.org/portuguese/docs/2007/06/11/russia16129.htm

http://hrw.org/english/docs/2007/06/11/russia16149.htm

Ouvem-se já os clamores...



"Levanta o clamor

levanta

O peixe
suor e rede
e o sal
suor e mar

O ferro
suor e fogo
e o pão
suor e foice

A noite
suor e febre
e a mão
suor e ossos

A morte
suor
e canto

Levanta o clamor
levanta"


"Canto" (à maneira de Nicolás Guillen), poema de Carlos Maria de Araújo, in "Ofício de Trevas"

Já escreveste a tua história?

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"Aquilo que nos redime e salva é a história pequenina que escrevemos uns com os outros."

António Alçada Baptista, ensaísta

As águas levam carícias e lavam mágoas...

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"A cavalo do vento
a chuva chegou
A chuva chegou
e o ossobó cantou.

Cantou o ossobó
seu canto molhado.
«Tchuva já vêo?
Já vêo si siô»

Já veio a chuva, Dêçu mum
e é um estoirar de amor pelas grotas
Té o ribeirão seco como mulher vazia
se abriu gostosamente ao ribeirinho entumescente.

As águas levam carícias de mãos.

Sob a folhagem amodorra a cobra preta
enquanto o potro e o menino do engenho
brincam e correm no terreiro os corpos molhados
do canto bonito do ossobó.

Já vêo a chuva?
Já vêo si siô.
Não vêo não siô.
Ah! Já vêo que ossobó cantou!

A preta do meu amor pariu,
pariu, meu Deus!, porque o ossobó cantou!"

"O Ossobó Cantou", poema de Francisco José Tenreiro, in "Obra Poética"

http://www.instituto-camoes.pt/encarte/encarte46g.htm



A autenticidade vale mais do que uma pedra preciosa...



"Quando somos tocados pela inquietação duvidamos, tornamo-nos mais humildes, mais profundos, mais autênticos, talvez mais humanos."

Fernando Dacosta, jornalista e escritor

http://www.apagina.pt/arquivo/Artigo.asp?ID=1619

Para quando escolas ecológicas?

Le Monde de L' Éducation

A morada do sentir



"O pensar constrói a sua morada no lugar mais modesto do sentir."

Vergílio Ferreira, escritor

A poesia é uma canção em flor



"Descansa, amor,
entre os meus cabelos;
e o desejo de vê-los
ainda em flor.

Descansa, amor,
tua esperança;
em mim descansa
o que em ti arde:

aquilo que se quer
sempre se alcança
e nunca é tarde.

Descansa, amor,
entre os meus cabelos;
felizes ou infelizes
(os dias é vivê-los)
em mim descansa
os braços, as raízes
e as palavras que me dizes."


"Canção", poema de Papiano Carlos, in "As Florestas e os Ventos"

A vida flui entre os dedos...


"Não, a vida não é uma festa permanente e imóvel. É uma evolução constante e rude."

Ramalho Ortigão, escritor

A superfície das lágrimas



"Guio-me
Por teus olhos abertos
Sobre a trémula e ardente
Superfície das lágrimas.

De tantas coisas
É feito o Mundo!

Entre escombros, espigas, dias e noites
Procuram os homens ansiosamente
O ramo de louro.

Quando, fatigados,
Próximos estão do limiar, do pórtico,
Os homens deixam, à entrada,
Suas mais queridas coisas.

E ei-los que apenas se incomodam
E se interrogam
Sobre o modo mais simples
De se despir e adormecer."


"Guio-me", poema de Raul de Carvalho, in "Mesa da Solidão"

Solidão



"- Solidão, tem?
- Todos temos. Precisamos é de aprender a dar golpes de rins para lhe escapar, para a enfrentar. A solidão acompanha-nos pela vida fora, faz parte de nós..."

Matilde Rosa Araújo, escritora

http://www.mulheres-ps20.ipp.pt/Matilde_Rosa_Araujo.htm#Biografia


Estes rios que de nós correm...



"As lágrimas interiores choradas
em outras horas queimam-te, defloram-te, secam-te.

A ansiedade já esgotada
tornou-te o peito um lago.
Ou um campo aberto, fundamento cavo.

Que venham novas, brandas lágrimas,
após tantos dias rancorosos.
E com elas...
mais nada, mais nada, mais nada.

Jugulada a maldade,
morta a inveja.

Estes rios que de nós correm,
que a nenhum mar vão ter,
indepósitos, perdidos e doces,
finalmente doces,
que fluam,
que corram,
corram..."


Excerto de "Bagatelas", poema de Irene Lisboa, publicado no Diário Ilustrado a 23-7-1957

http://www.instituto-camoes.pt/CVC/figuras/irenelisboa.html



Quando não cabemos na vida...


"Quando não cabemos na vida, no corpo que recebemos, dilatamo-nos pelo sofrimento, o nosso e o que provocamos nos outros, para tentar renascer sobre os corpos que destruímos."



Teixeira de Pascoaes, poeta e filósofo
http://www.instituto-camoes.pt/CVC/figuras/tpascoaes.html

Os búzios não falam só do mar...



"Na praia da Areia Branca
os búzios não falam só do mar:
- falam das pragas, dos clamores,
da fome dos pescadores
e dos lenços tristes a acenar.

Búzios da praia da Areia branca:

- um dia
haveis de falar
unicamente do mar."

"Dois Poemas [este é o primeiro] da Praia da Areia Branca", de Sidónio Muralha, in "Passagem de Nível".

Nas margens do sentimento



"Desvio-me da realidade e o silêncio nasce nas margens do sentimento."

Nuno Júdice, poeta

A respiração do mar...



"Neste mar à minha frente
O sol repoisa e os nossos olhos dormem...

- Caem saudades mortas como chuva miúda,
Ou sobem, trémulas, como o vapor das algas,
Ou ficam, extáticas como um bafo da areia,
Calmas, sobre a paisagem,
Como um véu de cambraia deixado...

Não sei se é o calor das algas,
Se é o bafo da areia que baila,
Ou se é a chuva miúda que cai neste dia de sol
Como um véu de cambraia deixado,

Sei que me lembram os signos do zodíaco
Em boa caligrafia,
Uns signos como nem sequer eu tinha imaginado!...

E este calor que dimana da terra e nos confunde com ela,
Nos aquece as pernas de encontro à areia, numa vida exterior
Com mais sangue que a nossa e, sobretudo, cheia
Duma inconsciência que se não parece com nada,
Esta respiração pausada como as ondas, de trás para diante
Fazendo, lentas, e desfazendo
A mesma curva humaníssima e sensível,
Faz-me escrever, devagar, e com letra de menino pequenino
Sobre o chão acamado, esta palavra
AMOR."


"Maresia", poema de António Pedro, in "Aventura, nº 3"

http://pt.wikipedia.org/wiki/António_pedro

O Viandante


Os lábios
do vento
vibram
retemperadoras
sinfonias
pela
geografia
da pele

Os seus
sinuosos
braços
alíseos
possuem
a cadência
ondulante
do centeio
na planície
do vislumbre


Como pêndulos
os seus dedos
deambulam
pelo mapa
do fogo
reverberando
silenciosas
tempestades

As veias
dos caminhos
dilatam-se


O sal da língua
funde-se
com a terra
numa química
indecifrável

Ao viandante
qual folha outonal
revoluteando no ar
nada mais resta
do que deixar
enleiar-se pelo
doce e suave aroma
do fragor da brisa


V. Solteiro, 12.06.07

O corpo é o silêncio...



"Se duvidas que o teu corpo
Possa estremecer comigo -
E sentir
O mesmo amplexo carnal,
- Desnuda-o inteiramente,
Deixa-o cair nos meus braços,
E não me fales,
Não digas seja o que for,
Porque o silêncio das almas
Dá mais liberdade
Às coisas do amor.

Se o que vês no meu olhar
Ainda é pouco
Para te dar a certeza
Deste desejo sentido,
Pede-me a vida,
Leva-me tudo que eu tenha -
Se tanto for necessário
Para ser compreendido."

"Se duvidas que o teu corpo", poema de António Botto, in "Canções"

Todos os dias...



"Há homens que lutam um dia, e são bons; há homens que lutam um ano, e são melhores; há homens que lutam vários anos, e são muito bons; há outros que lutam por toda a vida, esses são imprescindíveis."

Bertold Brecht, dramaturgo, poeta e encenador

http://pt.wikipedia.org/wiki/Bertold_Brecht

http://video.google.com/googleplayer.swf?docId=-8369937444487479324&hl=en